A situação de penúria de um idoso expõe a face cruel da justiça brasileira. O comerciante Carlos Dias dos Santos, de 74 anos, era milionário em 2012, depois de receber uma indenização. Com medo da instabilidade econômica do país e insegurança jurídica, foi levado a aceitar a oferta dos donos da Usina Paraíso S.A., seus clientes nos negócios de molas de caminhão, para aportar a quantia em commodities.
Sob persuasão, entregou o dinheiro aos donos da indústria, por meio de pessoas interpostas (leia-se empresa Faria Corretora, intermediária) para receber em etanol na safra sucroalcooleira. A intermediação se dava pela seguinte razão: o dinheiro não poderia cair na conta da Paraíso, porque certamente seria bloqueado para pagar dívidas e a Faria Corretora tinha escritório dentro da Usina e o diretor executivo da indústria, Geraldo Coutinho, negociava diretamente com o credor.
A indústria localizada em Campos dos Goytacazes, Norte Fluminense, enfrentava uma fase difícil: sem dinheiro e sem crédito bancário para tocar a safra. Só conseguiu produzir naquele ano graças ao dinheiro do idoso, algo em torno de R$ 4 milhões na época, que em valores corrigidos chega a quase R$ 30 milhões.
Carlos Dias dos Santos nunca foi ressarcido. A Usina conseguiu entrar em recuperação judicial e não incluiu o crédito do aposentado. Foi um calote que deixou marcas. Hoje o idoso vive na penúria, na cidade de São Fidélis, trabalhando na colheita de tomate em propriedades rurais para sobreviver, enquanto tenta resgatar o dinheiro por meio de ações judiciais: A justiça no Estado do Rio é dispendiosa e morosa. Os processos já se arrastam por mais de cinco anos.
Morosidade da Justiça pretege usineiros
O idoso pediu gratuidade, mas inicialmente o pedido foi negado. Quatro anos depois, quando finalmente teve o pedido concedido, em uma semana a indústria conseguiu gratuidade de justiça para recorrer e anulou a decisão. Uma ironia: o idoso conseguiu gratuidade em quatro anos, a indústria que lhe deve conseguiu em uma semana para derrubar uma decisão que favorecia o credor.
Carlos Dias dos Santos vivencia a realidade de uma justiça que ampara a regalia de ricos fazendeiros do interior contra o direito de um idoso que ficou pobre.
A Usina Paraíso, atualmente, pertence ao rico empresário Renato Abreu, associado a Coagro, cooperativa controlada pelo vice-prefeito da cidade, Frederico Paes, e controladora da Usina Sapucaia. Ele é executivo da MPE e chegou a ser implicado na Operação Lava Jato por pagamento de propina. Para assumir a Paraíso, ele criou uma imobiliária, a Veznella, que funciona no mesmo endereço da MPE, no Rio de Janeiro.
A imobiliária alugou todo o parque industrial e terras da Usina Paraíso e a cana está sendo destinada à usina Sapucaia.
A sociedade Coagro-Veznella-MPE está dilapidando o patrimônio da Usina Paraíso na mesma proporção que a morosidade da justiça consome o tempo de espera do idoso para reaver o dinheiro sugado por um calote milionário.
Caso deve ser levado ao CNJ
Tem algo de podre na República do Chuvisco e mau cheiro que começou nos canaviais, chegou aos tribunais. A morosidade dos processos envolvendo o aposentado e a indústria já foi levado à Corregedoria do Tribunal de Justiça e também será denunciado ao Conselho Nacional de Justiça, o CNJ. O caso também deve ser objeto de denúncias junto à Receita Federal.
O caso foi tema de uma reportagem da Agência Fonte Exclusiva em 2017. Nesses últimos quatros anos, a situação do idoso continua no mesmo estágio em âmbito judicial, onde tenta reaver o dinheiro, que em valores corrigidos chegam a quase R$ 30 milhões.
Os processos estão paralisados, assim como as denúncias de associação criminosa, envolvendo os usineiros e uma empresa que atua com venda de álcool. AS denúncias são apuradas por meio de inquérito na 134ª Delegacia Legal (Centro).
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