Campos-RJ: Em artigo, Caio Vianna define como preocupante a guerra que o prefeito eleito Rafael Diniz pretende declarar contra o Uber
*Por Caio Vianna
Desde que disputei a prefeitura de Campos dos Goytacazes em outubro deste ano, tenho primado pela discrição sobre temas relacionados ao novo governo que se iniciará em janeiro próximo. Mas, um tema, especialmente, me chama a atenção nos últimos dias e me instiga a opinar: a inserção espontânea da cidade no ambiente de economia compartilhada e o ensaio de resistência por parte do futuro governo.
As grandes transformações sociais e econômicas sempre trazem um profundo impacto sobre as relações de trabalho. É um processo de rupturas, muitas vezes, doloroso e que enfrenta grandes resistências, mas que no decorrer do tempo se reflete em avanços para o conjunto da sociedade.
Os conflitos nesta seara são latentes no Brasil, bastando recorrer à série histórica das transformações mais recentes. A revolução industrial, no século XIX, sepultou o modelo de produção escravagista. O Brasil, que foi o último país do mundo a abolir a escravatura em 1888, tentou resistir ao novo modelo de produção por pressão de suas oligarquias, contudo, se rendeu as evidências, o que custou a queda da monarquia no reinado de Dom Pedro II.
Historiadores apontam que o golpe militar que derrubou a monarquia eclodiu por pressões da cafeicultura escravocrata, que insistia no modelo superado. A resistência impôs o atraso, porque só entraríamos de fato no processo de industrialização no século XX, a partir do governo Vargas.
Nos últimos anos, as mudanças demográficas, culturais e tecnológicas, desta vez decorrentes da quarta revolução industrial continuam impactando as relações de trabalho e exigindo mudanças nas estruturas organizacionais e dos indivíduos.
O fato mais recente em algumas cidades brasileiras é o aplicativo Uber, este sistema admirável de economia compartilhada. Por meio deste aplicativo, usuários de transportes podem solicitar um serviço personalizado de atendimento, a um custo competitivo e com avaliação da qualidade do serviço em tempo real. É uma mudança de paradigma presente em vários países e até recentemente restritos as capitais do país.
Milhares de usuários conseguem superar deficiências no sistema de mobilidade urbana e milhares de trabalhadores conseguem obter renda neste momento de crise. Só em 2014, a empresa Uber diz ter gerado 50 mil empregos no mundo mensalmente por meio de cadastramento de motoristas. No ano passado a meta era gerar um milhão de empregos quando a Organização Mundial do Comércio preconiza o fim de cinco milhões de empregos no mundo nos próximos anos por conta do choque da quarta revolução industrial.
No território nacional a empresa atua em 27 cidades, com 4 milhões de usuários ativos. Estamos falando de um produto da quarta revolução industrial que veio para ficar e mesmo nas cidades em que encontra resistências, a justiça tem mantido os serviços funcionando por meio de decisões favoráveis.
No Rio de Janeiro, segundo o prefeito eleito Marcelo Crivella, a empresa pagou cerca de R$ 5 milhões de ISS a prefeitura só este ano, receita que o município não poderá abrir mão, segundo ele.
Diante das evidências favoráveis deste serviço e do fator preponderante, que é a notória aprovação dos usuários – fato citado por Crivella – causa perplexidade a promessa do prefeito eleito de Campos, Rafael Diniz, de impedir o funcionamento do Uber para favorecer os taxistas. Assumiu este compromisso em audiência pública na Câmara de Vereadores, diante de uma platéia de taxistas. Tomara que seja apenas um posicionamento equivocado e não um surto de demagogia diante de um nicho de eleitores.
É preciso entender que nesta disputa entre taxi e Uber pelo mercado, um sistema não anula o outro. Os dois podem conviver harmonicamente, estabelecendo uma produtiva concorrência no mercado. Concorrência é sempre salutar numa economia de mercado. Não se deve inibir a criatividade, principalmente quando gera emprego, renda, negócios e fluxo de renda. Neste ambiente de inovação tecnológica cai bem uma frase de Caetano Veloso com a irreverência do tropicalismo no enfrentamento da ditadura: “é proibido proibir”.
O risco da intromissão do poder público na condição de patrono dos taxistas, quando deveria arbitrar conflitos, não é saudável. É altamente perigoso. Principalmente quando na audiência pública tem um ingrediente que ninguém ousou dizer o nome: o mercado de locação de ponto de taxi, algo que funciona à margem da legislação. São inúmeros os taxistas que atuam como arrendatários de pontos, se submetendo a uma dura rotina de exploração em nome da sobrevivência.
É preciso lembrar que Campos dos Goytacazes já foi vanguarda ao destacar-se como primeira cidade da América Latina a inaugurar a luz elétrica. Imagine se nesta época os governantes resolvessem barrar a novidade para defender a iluminação por meio de lampiões! Ou impedir a chegada da ferrovia ou dos carros motorizados para preservar o emprego dos estafetas! Inimaginável.
A quarta revolução industrial bate as nossas portas. Neste mundo de alta volatilidade somente a atualização sistemática, a boa prestação de serviços e a inserção de novas tecnologias será capaz de oferecer oportunidades no mercado de trabalho. É preciso buscar modelos de inclusão da sociedade nesta nova realidade e evitar toda e qualquer tentação ao retardamento. O Uber é apenas um elemento de uma economia compartilhada que veio para ficar.
*Caio Vianna atua na área de tecnologia de informação, é presidente do diretório municipal do PDT em Campos dos Goytacazes e foi candidato a prefeito na eleição deste ano.