No momento presente, onde a poderosa indústria automobilística brasileira (dominada por capitais internacionais) ganha incentivos para o barateamento do carro popular, mediante redução de impostos, com inegáveis efeitos de encadeamento para frente e para trás na cadeia produtiva do setor, vale a pena trazer para a agenda o debate da mobilidade urbana.
Afinal, quem subsidia o carro destinado ao segmento de classe média pode e deve subsidiar tarifa urbana barata para a classe trabalhadora de 100 milhões de brasileiros.
Não esqueçamos que a qualidade de vida de uma comunidade, também está ancorada na capacidade de acessar espaços e aproveitar os territórios produtivos, educacionais e de lazer.
O país possui 200 municípios, entre capitais e cidades de porte médio, onde vivem cerca de dois terços da população e observa-se ali a geração de uma parcela significativa da renda e do emprego. O segmento de renda C, D e E, que depende do transporte urbano para se deslocar para o trabalho, representa 80 por cento do contingente populacional.
Mobilidade urbana é sinônimo de oportunidades produtivas e diminuição do abismo entre o centro e as periferias de nossas cidades. O transporte está entre os itens de maior impacto nos orçamentos familiares, no custo de vida das famílias, atrás somente do item habitação/energia, e na frente até dos gastos como alimentação.
O acesso livre à cidade, com políticas públicas de transportes e mobilidade urbana bem planejados e adequadamente financiados tem efeitos positivos sobre um componente que representa 70% do PIB nacional – o consumo das famílias, além de seus inegáveis efeitos sobre a demanda do comércio e dos serviços mercantis das economias locais.
Em junho de 2013, portanto decorridos meros 10 anos – a questão tarifária ensejou o estopim das manifestações em diversas capitais brasileiras, num ciclo denominado internacionalmente com “Cidades Rebeldes”, quando lutava-se pelo Passe Livre nos transportes públicos urbanos.
Mais recentemente, a pandemia colapsou a demanda por transportes nos grandes centros e cidades médias, bem como desequilibrou financeiramente as concessionárias e colocou na ordem do dia a necessidade de recuperação das áreas centrais de diversas cidades, mediante projetos de revitalização, onde o transporte é crucial.
Nesse contexto, 74 cidades brasileiras já praticam, pelo menos parcialmente, tarifa zero, ou tarifas diferenciadas e mais acessíveis às suas populações. No primeiro turno das últimas eleições 40 milhões de brasileiros ficaram isentos do pagamento da tarifa de transporte público para votar. Tarifa barata gera externalidade positiva para a sociedade.
Nesta sequência, talvez o melhor caminho seja a implantação gradativa de um Sistema Único Nacional de Mobilidade Urbana financiado por orçamentos públicos da órbita federal, estadual e municipal, com participação do capital privado.
O SUS da mobilidade (SUMU) já é objeto de coleta de assinaturas para que o Congresso se debruce sobre este tema crucial para o futuro de nosso país. Alvissaras!