FATO ISOLADO? Não. O Facebook anda censurando bobagens e coisas seríssimas sem sabermos o critério pelo qual passam as postagens censuradas no bloqueio.
Maurizio Barraco, grande ilustrador italiano, teve sua página bloqueada, sim, bloqueada, por motivo de serem as suas gravuras “pornográficas”. Ao contrário, são figuras de mulheres, desenhadas a mão, em poses eróticas, sensuais, de uma genialidade e beleza sem limites. Como a discussão sobre a diferença entre erotismo, pornografia e obscenidade é complexa e antiga, os critérios, hoje, em época de conturbado conservadorismo lato sensu, de alta intolerância, o que podemos dizer?
Bem, tomo Contos D’Escárnio – Textos Grotescos, de Hilda Hilst, por exemplo, em que ela escreveu: “Porque cada um de nós… tem que achar o seu próprio porco, (Atenção, não confundir com corpo) Porco, gente, porco, corpo às avessas” (HILST,1992). Em suas entrevistas, Hilda Hilst não se defendia absolutamente de ser considerada, por muitos, uma escritora que convivia revoltada e em aliança com o fracasso. Mas foi considerada pornográfica durante longo tempo. Mero preconceito, no caso dela, ao talento da escritora.
O mesmo ocorre no caso de Maurizio Barraco, que trabalha a anima em seus desenhos, aquilo que dá vida ao princípio do prazer. Se Hilda, ao parecer incomodada em apresentar como “real” histórias do ser humano, absurdo em sua própria natureza, indubitavelmente, ela constrói uma escritura toda armada de estratégia própria que, pelo menos, em princípio, impede o leitor de mergulhar, da forma tradicional, na trama e nas personagens:
“Esse pensamento metafísico, de assentos trágicos, tem, em Joyce e Hilst, o sistemático contraponto do humor e do desejo de que seu “leitor ideal sofra uma insônia ideal (Ellman, 1989: 865). Joyce e Hilst escapam da angústia, para chegar ao riso.” (Duarte, op. cit, p. 9). E complementa: “…Que é a única salvação possível para os seres que se pensam, a si mesmos e ao mundo no extremo e no excesso.” (Ellman, op. cit.: 865)
As mulheres de Maurizio são extremamente trágicas ou tragicamente sensuais. Sob esse aspecto, o que Vilma Arêas nos diz em “Narrativa in extremis” (2005, p. 104-11):
Em suma, descongestionar, limpar a ferida, permitir que o sujeito (o personagem) volte a adquirir a própria estatura, longe da comiseração. Daí a necessidade de uma nova atitude que se limita com a falta de tato, o “tato” vizinho da mentira, conforme afirma Adorno. Serão necessários, portanto, a falta de decoro e o desdém pela estetização literária, que costuma atenuar a matéria ingrata. Ao contrário disso, uma regra severa ordena que se fixe tal matéria com a objetividade e o despojamento necessários, aos quais não falta a provocação. Essa opção pela lucidez discute suas escolhas de estilo e de afirmações.
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¹Adorno, “Para uma dialética do tacto”, em Minima moralia, reflexões a partir da vida danificada. (Trad. Luiz Eduardo Bicca). S. Paulo, Ática, 1993, 2a. ed.
Provocação é a palavra chave do bloqueio. Não aceitam! A lucidez de que nos fala Arêas é a voz! Essa é a tópica do momento. Ou vozes, animae para fazer jus ao coro de vozes que se apresenta na literatura e nas artes, limpando suas feridas. No todo, o mundo virtual vive um verdadeiro caos na sua liberdade, na sua fragilidade e não precisamos ir muito longe para entender nossas próprias contradições e paradoxos. Fora, fu qualquer tipo de censura às artes.